domingo, 21 de novembro de 2010

Quinze Minutos

"O objetivo da escola é estudar, estudar e estudar; para ir para o segundo grau e estudar, estudar e estudar; para ir para a faculdade e estudar, estudar e estudar; para conseguir um bom emprego, constituir família e ter filhos. Filhos que vão para a escola, para estudar, estudar e estudar…” (Linus van Pelt)


É incrível como algumas atividades pateticamente simples para todas as pessoas adquirem um inesperado grau de complexidade de execução quando o executor (ou um dos executores) é ninguém menos do que eu. Uma prova disso foi quando no terceiro semestre da faculdade fui fazer um seminário com mais dois colegas. Tema escolhido, tínhamos que pesquisar na internet, fazer uma revisão, extrair o melhor que encontrássemos para decorar e apresentar...ou seja, tudo muito tranquilo (aparentemente).
Dei a idéia de que fôssemos fazer uma pesquisa no cyber de um amigo que havia sido meu colega de ensino médio, porque ele costumava me dar descontos, o que é muito importante quando se é universitário (e pobre).
Chegando no cyber, lugar lotado, encontramos por sorte um computador vago...iniciada a pesquisa, leitura feita, selecionado um banco de informações, restava-nos enviá-lo para os nossos e-mails após pouco mais de dez minutos da entrada no local.
No exato momento de nomear o e-mail, eis que entra um sujeito fardado e de voz grave com uma cara de poucos amigos exclamando alto: Polícia Federal, todo mundo parado onde está! Olhamos para os lados e "todo mundo" correspondia a mim, meus dois colegas e ao sócio do meu ex-colega dono do estabelecimento. Um dos meus colegas prontamente como que num último suspiro de vida uniu forças para teclar como nome do e-mail "Fudeu" e clicou rapidamente em "enviar".
Deu-se então início uma discussão entre o sócio do meu ex-colega dono do estabelecimento e os policiais. O Policial dizia: "você foi visto pelo circuito interno de câmeras roubando as placas dos computadores da Universidade e se mexeu com a Federal, mexeu com a gente". O "meliante" se defendia, mas o policial tirou sei lá de onde um papel que parecia uma daquelas cartas que os fãs mandavam para a Xuxa quando eu era criança e falou: "tua ficha criminal, furto disso, roubo daquilo, tráfico de drogas" e não parava mais de citar crimes...
Eu e meus dois colegas estávamos cada um mais assustado que o outro, o que somente se agravou depois que um dos policiais falou: "um de vocês, nos acompanhe"...nós os três nos olhamos e conversando entre si sem dizer uma palavra ficou decidido que eu teria que ir para o segundo andar do local para que... acontecesse algo comigo. Pau-de-arara, choques elétricos, chutes, cacetete na cabeça...eu sabia que alguma coisa estava para acontecer, mas o que seria?
Eu estava literalmente sem lenço nem documento e entendi então como deveriam se sentir os subversivos em tempos de AI 5.
Passados alguns minutos, desci, cabisbaixo e sem dizer nada. Então mais um de nós foi convidado a subir as escadas, o mais nervoso do trio, o qual enquanto subia com o andar lento de quem desfila no corredor da morte, olhava para trás lançando para os outros dois uma expressão de socorro...como que o último olhar de um condenado. Depois, foi a vez do terceiro, sério, abatido, a subir e descer. Lá em cima, nós assistimos à ação policial, o abrir e fechar de caixas na busca de provas que incriminassem o sujeito sócio do meu conhecido (porque a essas alturas do campeonato, amigo ou ex-colega já passou a ser próximo demais).
Conclusão da história, ficamos uma tarde inteira num estabelecimento onde deveríamos em condições normais ter passado quinze minutos.
Mas o curioso disso tudo é que não sei definir como azar ou sorte minha essas dificuldades para vivenciar o que é comumente simples para os demais, considerando que nesses momentos, acabo por ter ao invés de quinze minutos de vida que passariam despercebidos para qualquer um, uma boa história para contar (e para sempre) lembrar.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Desejos em Vermelho

"No livro da vida, as respostas não estão na parte de trás" (Charlie Brown)



Cedo a gente aprende que não pode ter tudo o que se deseja. A realidade cruelmente como se fora um semáforo acende uma luz vermelha e nos pede que paremos e passemos a sonhar com o possível quando tudo o que queremos é brincar com o impossível.
Quando eu era um gurizote queria tartarugas ninjas de natal (réplicas dos personagens do desenho), as quais nunca ganhei...acabei sendo presenteado com um carrinho e uma metralhadora com som de arma de verdade. Apesar de não estar nos meus planos, a arma de brinquedo "Matraca" fez a minha festa!
Eu me sentia um poderoso soldado mirando para tudo o que via pela frente e apertando o gatilho com os meus dedos pequenos...meus pais acabaram assim atirando no que viram e acertando no que não viram: nunca esquecerei aquele fim de ano e acredito hoje que ganhei o melhor presente que eu podia ter ganhado.
Já as tartarugas ninjas foram o presente que outro menino, um vizinho amigo meu, ganhou de natal após a mãe dele, antes de eu receber os meus presentes, me perguntar o que eu queria de natal.
Conforme os anos passam a gente continua tendo os nossos desejos (cada vez mais adultos) e se deparando com as limitações a nós impostas quando queremos o que não depende unicamente da nossa pessoa. Foi assim quando eu quis ter para mim uma garota ruiva que conheci durante a Faculdade; ela era (e é!) simpática, tinha a pele branquinha, um sorriso encantador, jogava vôlei como uma profissional, dizia que adorava conversar comigo...e não queria ter nada comigo além de amizade.
Preferiu sabe-se lá por que ficar com outro fulano aparentemente sem graça...mas o amor tem razões que a própria razão desconhece e com a "garotinha ruiva" não poderia ser diferente. Constatado esse fato, cheguei a pensar que na esfera sentimental da minha vida tudo havia dado errado, quando na verdade apenas esse pensamento não estava certo.
Me diverti muito mais com as "Matracas" que surgiram na minha vida depois...e hoje, na espreita, sob o meu olhar atento de atirador estão outros desejos, os quais revelando-se tartaruga ou metralhadora, me possibilitarão reafirmar que embora nem tudo o que desejemos possamos ter, o que conquistamos por força da sorte e da nossa busca pode muito bem superar a melhor das coisas que neste momento imaginamos poder desejar.